400 municípios da Bahia elaboraram seus referenciais curriculares
Para que a BNCC chegue às escolas e impacte o trabalho dos educadores e a aprendizagem dos estudantes, muitas discussões e reflexões devem ser feitas. Em cada canto do país, as equipes das secretarias de educação estão mobilizadas para superar os desafios cotidianos, lidar com os limites trazidos pela Covid-19 e fazer com que os referenciais curriculares sejam criados.
O referencial curricular do estado da Bahia foi construído em regime de colaboração com os municípios e aprovado em dezembro de 2019. Em 2020, com apoio do Itaú Social e parceria com a Universidade Federal da Bahia (UFBA), a União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação na Bahia (Undime/BA) e a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme), foi criado o Programa de (Re)Elaboração dos Referenciais Curriculares nos Municípios Baianos.
A iniciativa teve a intenção de apoiar as redes na elaboração de seus próprios referenciais, com participação dos educadores. “No levantamento que fizemos entre fevereiro e março, vimos que 81,8% das redes gostariam de fazer adaptações locais ou criar o próprio referencial curricular, e apenas 8% dos municípios baianos disseram querer aderir integralmente ao documento baiano sem alterações. Por isso, acreditamos ser importante trabalhar em parceria com as redes e apoiá-las nesse processo de escuta e de escrita”, conta Renê Silva, coordenador do programa junto à Undime Bahia.
Cairu está entre os municípios que aderiram ao programa. Conheça mais aqui.
Quando a proposta vira realidade
A proposta para apoio aos municípios na construção dos referenciais curriculares foi feita aos 417 municípios do estado e 402 deles aderiram. “O caminho foi longo e exigiu articulação, já que envolveu mais de 90% do estado e foi realizado em ano de pandemia da Covid-19, quando as grandes restrições atingiram também a área da educação. Para promover a participação dos educadores na construção de seus referenciais municipais, foi criada uma estrutura para momentos formativos feitos de forma remota”, explica Renê.
Como parte da governança havia uma coordenação geral (com especialistas em diferentes áreas para orientar as demais instâncias), profissionais para coordenar os processos formativos em cada um dos 27 territórios de identidade (divisão de regiões já estabelecida e consolidada no estado) e, finalmente, as secretarias municipais de educação.
Em cada secretaria foi estipulada uma comissão responsável pela coordenação dos trabalhos e pelos Grupos de Estudos e Aprendizagens (GEA). As formações dos GEA envolveram os professores de cada rede e aconteceram a distância no Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA) disponibilizado pela UFBA, além de uso de outros recursos digitais. Os educadores estudaram a BNCC e o documento curricular do estado da Bahia, discutiram sobre as necessidades e especificidades locais e de cada território, além de peculiaridades dos diferentes segmentos, componentes curriculares e modalidades de ensino. Os participantes foram divididos em grupos, conforme sua atuação. “Todo o processo foi construído para colaborar com a troca de experiências e de conhecimentos entre os profissionais, e incluiu temas integradores e contemporâneos. Os GEA foram um sucesso, com mais de 63 mil professores participantes!”, diz Renê.
Para aprofundar os conhecimentos também foram transmitidos vídeos ao vivo semanais sobre elaboração dos referenciais curriculares no Youtube, no Canal “Web TV Undime Bahia” – as produções já alcançaram 1 milhão de visualizações.
Nos primeiros dias de janeiro de 2021, o Programa de (Re)Elaboração dos Referenciais verificou avanços: mais de 75% das redes finalizaram seus referenciais curriculares e em 25% já foram homologados.
Experiência de mobilização de educadores no município de Varzedo
Uma das localidades que está com o referencial curricular aprovado é Varzedo. Fernanda Argolo é técnica da Secretaria Municipal de Educação e esteve envolvida em todo o processo de discussão sobre esse documento do município ao longo de 2020 até a sua homologação. Segundo seu relato, a experiência foi marcada pela ampla escuta e participação da comunidade local, incluindo professores, gestores escolares, estudantes e familiares, conselho municipal, representantes dos trabalhadores rurais e das escolas privadas e estadual, agentes comunitários de saúde e sindicados dos educadores.
Em junho, um mês após Undime e UFBA iniciarem as formações a distância com os municípios, a equipe da Secretaria elaborou um questionário para ser preenchido pela comunidade, incluindo perguntas sobre qual deve ser a função da escola, de que forma os estudantes aprendem melhor, como a família pode colaborar com a aprendizagem, quais aspectos sobre o município gostariam que fossem contemplados no currículo para o desenvolvimento integral dos estudantes, e outras tantas questões. A intenção foi abrir um canal de escuta das demandas e anseios da população para considerá-las na construção do currículo. “Recebemos 1.800 contribuições! A tabulação das respostas foi trabalhosa, mas a participação ampla nos deixou muito satisfeitos e conscientes da responsabilidade de incorporar os registros nas discussões e no documento”, conta Fernanda. Em agosto, com as respostas organizadas, foi possível ver a riqueza dos registros da comunidade e procurar incorporar as ideias ao desenho curricular.
Em uma rádio local, a Secretaria de Educação criou um programa durante o período da pandemia. Especialistas, professores e membros da comunidade se encarregaram de detalhar temáticas diversas, como a política de currículo, as especificidades para cada segmento e modalidade, e mostrando que o referencial curricular vai ser o ponto de partida para a construção dos Projetos Políticos Pedagógicos e para orientar o trabalho do professor em sala de aula. Esses programas de rádio foram também disponibilizados via internet e distribuídos por Whatsapp, sendo possível manter o contato com a população e mostrar o trabalho que os educadores estavam realizando.
Ao longo dos meses, conforme avançava o conhecimento dos Grupos de Ensino e Aprendizagem (GEA) e dos profissionais responsáveis pela governança do currículo, as discussões entre os municípios também ficaram mais ricas. “Intensificamos a troca de experiências com os profissionais da nossa região, o Território de Identidade do Recôncavo Baiano, impulsionados pelo formador territorial do programa. Aprendemos ao ver como cada município vizinho se comunica com a comunidade e insere os aspectos locais no currículo. Os momentos formativos nos deram condições de construir saberes e exercitar a autonomia para a autoria do texto, considerando os cenários e identidades curriculares globais e locais, tudo em vista o direito de aprender e o desenvolvimento integral dos sujeitos”, conta Fernanda.
Quando o referencial curricular de Varzedo estava em sua versão final, a equipe fez uma consulta pública para apresentá-lo e acolher as sugestões. Em novembro, já foi aprovado pelo Conselho Municipal de Educação e em 2021 será o momento de investir na formação dos professores, tanto para que os profissionais estudem formas de realizar as atividades com os estudantes quanto para que tenham apoio para atravessar o momento atual, no contexto da pandemia.
“Em 2020, graças à ação formativa e aos cadernos de orientação do Programa, conseguimos nos dedicar ao nosso referencial, aprendemos a usar a tecnologia a nosso favor, nos aproximamos mesmo em tempo de distanciamento social. Estamos orgulhosos por construir um documento feito com base em nossa história e também cumprir dispositivos do nosso Plano Municipal de Educação. O texto exprime o que de melhor pudemos fazer com as condições asseguradas e com os sujeitos desse tempo, mas que traduz o compromisso com a educação integral de crianças, adolescentes, jovens, adultos e idosos no município de Varzedo”, conclui Fernanda.
O processo de construção dos currículos no país
Estão finalizados em todo o país os referenciais curriculares estaduais construídos em regime de colaboração com os municípios e, em grande parte do Brasil, os municípios também homologaram seus currículos. Cada rede pode decidir por adotar o referencial estadual sem modificações, adaptá-lo para sua realidade ou criar um novo. Depois disso, os próximos passos para a implementação desses documentos incluem as adequações na formação dos educadores, nos materiais didáticos, nas avaliações e a revisão dos Projetos Político-Pedagógicos das unidades escolares.